segunda-feira, 19 de junho de 2017

Mesa-Malu

Era para se um programa simples, inocente. Malu não esperava ficar sobrando. Quando estava se arrumando pela manhã, imaginou que seria como todas - ou quase todas - as outras saídas entre amigos, mas, além dela, havia apenas mais quatro pessoas. Dois casais... e ela.
Isso só podia ser carma! Além de não conseguir alguém com quem trocar carícia, alguma força maior ainda tinha o prazer de esfregar isso em sua cara, fazendo com que ela vivesse para segurar vela.
Ela bem que tentou arrumar uma desculpa para ir embora, mas os tais amigos insistiram para que ela ficasse, talvez por inocência, talvez por estarem se divertindo com a situação. Malu se deu por vencida e permaneceu no cinema, junto com os quatro pombinhos. E, como se as coisas já não estivessem ruins o bastante, o filme escolhido era uma comédia romântica. A situação de Malu não era das melhores. Imagine, querido leitor, estar sentado numa sala de cinema, entre dois casais, que trocam salivas a todo tempo, assistindo a uma comédia romântica, enquanto se tem uma crise sentimental. Penso que nenhum de nós gostaria de estar no lugar a morena baixinha.
Após o filme, todos se rasgaram em elogios. "Estão elogiando o que?", Malu pensou, "A única coisa que viram durante todo o filme, foi aboca do seu parceiro". Mais uma vez Malu tentou se livrar deles e ir para debaixo de seus edredons, mas:
- Vamos fazer um lanche. Vai ser legal!
Sim. Foi legal. Tão legal quanto o filme. Acha que as coisas mudaram só porque estavam fora da sala escura? Claro que não! Os carinhos, as palavras fofas. Tudo continuou. Malu, para se distrair de seu desconforto, começou a encarar uma mesa vazia. Ela se identificou com aquela mesa. É um pensamente um tanto estranho, sem dúvida, mas ela quase pôde se ver no lugar daquela mesa. Uma mesa onde ninguém queria se sentar. Não havia embalagens vazias, nem nada que indicasse que alguém já tivesse se aproximado daquela mesa. Aquela, sem dúvida, era uma outra versão de Malu. A menina estava tão concentrada olhando para o seu outro eu, que não percebeu que seus amigos tentavam incluí-la na conversa.
Malu estava a ponto de se levantar e ir até lá, compartilhar esse momento de solidão com a mesa, quando um movimento diferente despertou sua atenção. Alguém estava sentando na mesa. A Mesa-Malu não estava mais vazia. Alguém teve o desejo de ocupá-la, afinal. Malu sorriu com aquela visão. Era um menino, parecia ser uns dois anos mais velho. Cabelos castanhos, curtos e bagunçados, piercing no lábio inferior, calça jeans rasgada e uma blusa preta, que trazia o nome de uma banda de rock. Tinha uma beleza natural.
O tal menino a olhou, pegando Malu desprevenida, já que essa ainda sorria. A observou durante um tempo e abriu um sorriso logo depois. malu desviou o olhar quase que imediatamente, pois não possuía o monopólio da Atividade Encaradora. Quando voltou o olhar novamente para o garoto, ele estava em pé, andando em sua direção. Isso foi o suficiente para que ela sentisse as tais borboletas no estômago, seu sangue fervesse e seu coração batesse tão forte e rápido, como se fosse rasgar o peito e sair por aí, pulando. O garoto vinha andando, aproximando-se cada vez mais. Andando... A cada passo, Malu ficava mais nervosa. Então, ele chegou até ela e... Espera! Ele continuou andando. Malu olhou para trás a tempo de vê-lo se sentar em outra mesa, junto com uma loira.
A sua mesa ficou vazia. De repente, era assim que devia ser. Talvez esse fosse o destino dela: ser apenas Malu. Sem pessoas sentadas nela, nem comendo em cima dela, ou sujando a sua superfície.

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Quer viver comigo? Acostume-se com a minha ironia, com as minhas manias. Não reclame do meu exagero ou do meu devaneio. Quer viver comigo? Aprenda primeiro: sou a rainha do drama.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

Uma garota, uma história I

Uma garota com segredos. Histórias que nem para o papel chegou a contar. Histórias tristes, com fins deprimentes. Histórias que ela tentava esquecer, mas as marcas, ainda que pequenas e quase invisíveis, insistiam em lembrar-lhe de tais fatos. Uma garota, uma lâmina, um choro, muitos problemas e seu pulso. Uma história.
"Eu sou incompreendida!", ela dizia, "Todos me abandonaram. Ninguém se importa!".
Depois de feitos os movimentos horizontais, o vermelho cobriu sua pele morena.
Ela não queria morrer. Não, por mais que dissesse isso, esse nunca foi o seu desejo. Ela queria apenas espantar a dor emocional, esquecer que o coração doía e concentrar-se na dor física.
Hoje, observando as marcas deixadas em seu pulso esquerdo, percebe quão estúpida foi em alguns momentos. Claro, ela lembra do tamanho da dor que sentia, ela lembra do motivo pelo qual começou a fazer tal coisa, mas isso nunca tirou sua dor realmente, e só hoje ela percebe isso.
Agora, ela é apenas uma garota com uma história que nunca foi contada de forma verdadeira e completa.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Não se incomode

Não se incomode quando eu disser que já sofri. Pois sofri por tempo demais. Mais tempo do que a sua capacidade de se incomodar. Portanto, não se incomode. E não se importe quando lhe disser as coisas que eu fiz quando sofri. Foram coisas horríveis. Mais terríveis do que a sua capacidade de se importar. É perda de tempo. Por favor, não me de atenção, não queira ouvir minha história. Por mais que eu queira te contar, ela é maior do que a sua capacidade de compreensão. Não me julgue. Minha própria condenação já basta. Portanto, não perca tempo tentando e querendo entender. Não tente. Não queira. Eu não quero. Se fosse uma opção, eu também não me importaria, ou sequer me incomodaria. Se eu pudesse, essa história nem seria a minha. Minha história teria uma pote de ouro no final do arco-íris. Um belo caminho com uma bela recompensa. Mas não se incomode. Você não entenderia. Tente não pensar nisso. Eu não penso. Por favor, não se importe. Não quero que se lembre disso quando se lembrar de mim. Quer ter uma lembrança? Lembre do pote de ouro. Se importe com ele. Mas não se incomode.

Que se dane

"Cheguei cedo demais", pensei. Faltava 1 hora para que eles saíssem do colégio e eu já estava no portão esperando. Claro, eu não iria ficar apenas sentada esperando que eles saíssem, e não tinha nenhum outro lugar que eu pudesse ir enquanto isso. Eu só tinha uma opção: o livro dentro da bolsa. Está aí um ponto positivo de ser leitora.
Certo, o livro não diminuiu minha ansiedade, uma vez que eu conferia a hora a cada 2 minutos e achava que o tempo passava cada vez mais lentamente. Que tortura é ter que esperar. Mas me segurei. Não tinha mais nada o que fazer. Tentei ler e não olhar a hora por um tempo.
Quando os últimos minutos de espera chegaram, eu já não conseguia mais ler. Desisti. Não tinha lugar na minha cabeça para outras coisas. Eu só pensava na droga do sinal que não tinha tocado ainda. "O que eles têm contra tocar o sinal 5 minutos antes da hora da saída?" Mas, finalmente, o sinal tocou.
Esperei, esperei, esperei... Muitas pessoas saíram. Um mar-de-gente. Mas não vi rostos conhecidos. Quando a angústia ameaçou tomar conta de mim, eu ouvi um grito. Mas não um grito qualquer. Era um grito familiar. Ela veio correndo e se jogou em cima de mim. Saudade.
Depois dela, outros vieram. Outros me abraçaram. Senti muita falta de todos. Mas um em especial, me fez quase morrer de saudade. Enquanto me abraçavam, todos sussurravam coisas no meu ouvido: o tanto que me amavam, o quanto sentiram a minha falta... Mas quando ele me abraçou, palavras não foram necessárias. Só de estar ali, abraçada com ele, e ele abraçado comigo. Aquilo já era o suficiente. Palavras certamente estragariam aquele momento. Embora tivessem outras dezenas de pessoas em volta, observando o nosso momento, o momento era só nosso. Dane-se as pessoas em volta. Dane-se os olhos atentos. Dane-se essa coisa toda. O que importava era apenas o cheiro dele e seus braços apertando forte a minha cintura. E o resto? Que se dane.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

- O que você fez com ele? o matou? O prendeu? Escondeu? Onde o deixou? Preso? Como? Com correntes ou cordas? Ele consegue respirar? Ele ainda vive? Ainda pode ressuscitar?
- Não sei o que fiz com ele.
- Mas acha que ele pode voltar?
- Penso que não.
- Eu sinto por isso.
- Eu também.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Ele abriu aquele sorriso que faz minhas pernas bambearem e se aproximou mais de mim, dando dois curtos passos. Agora, com os corpos quase colados, pôs uma mecha de cabelo imaginária atrás da minha orelha. Meu coração, já a essa hora, estava do lado de fora do peito, correndo e saltitando por aí. Ele tomou meu queixo entre o pelegar e o indicador e aproximou seu rosto do meu. Pensei, por um breve momento, que ele tinha confundido as coisas, assim como eu. Pensei, imaginei, sonhei que, para ele, tudo era muito mais do que uma mera amizade. Mas obtive uma resposta negativa quando seus lábios tomaram um rumo diferente dos meus, e depositaram um doce beijo em minha testa. Um ato carinhoso. Um ato que, por mais que não seja o que meu coração desejava em seu emocional, eu apreciava em minha razão.