Se eu soubesse que a dor da perda era tão grande, eu nunca teria saído do meu canto.
Antigamente, eu vivia num canto. O meu canto. Esse canto falava comigo. Ele dizia, não que as pessoas eram más, mas que a vida era má. Dizia também, que eu se eu me fechasse, não interagisse, não fizesse amigos, teria uma chance de ser feliz. Eu sempre escutei e obedeci ao meu canto, eu fazia tudo o que ele dizia e tudo sempre correu muito bem para mim. Claro, tinham uns probleminhas aqui e ali pelo fato de eu sempre estar sozinha, mas solidão nunca foi um problema. Houve uma época em que eu até gostava dela. E ainda gosto. Até que um dia, eu conheci umas pessoas. Essas pessoas eram diferentes de todas que eu já tinha conhecido. Por muitas vezes eu pensei:
por que não dar uma chance a elas,a vida? Mas a voz do canto viva ecoando em minha mente, e não me deixava esquecer de que eu era mais feliz assim. Eu me forçava a acreditar naquilo.
Um dia eu não aguentei. Eu os vi juntos, brincando, rindo. E eles me chamavam para fazer parte daquilo. O canto gritava em minha mente:
não vá. Não vá. Resista! Mas eu não queria resistir. Eu queria saber como era a vida social, pela primeira vez na minha vida. Então, simplesmente ignorei a voz do canto e o abandonei.
No início, eu me senti desprotegida. Claro, eu estava me lançando sorte, estava saindo do meu "porto seguro", explorando um terreno jamais explorado por mim. Estava me lançando nas da vida. Mas, com o passar do tempo, eu me acostumei e comecei a gostar desse novo estilo de vida: sempre cercada de gente, rindo, brincando. E, pela primeira vez, eu estava com pessoas loucas como eu. Eu não poderia estar mais feliz. "
Quem diria", eu pensava, "
largar o canto foi a melhor coisa que eu poderia fazer".
Eu não poderia estar mais enganada.
Enquanto estava com aquelas pessoas, fiz e vivi tudo o que uma adolescente normal deve viver: briguei, me reconciliei, me apaixonei, me iludi, sofri, superei. E tudo isso com elas, aquelas pessoas maravilhosas que me fizeram abandonar meu canto. Aquele que mentiu para mim o tempo todo, que me privou dessa felicidade.
Mas, como toda história bem escrita, essa também tem uma reviravolta. Sabe a vida? Sim, aquela que me deu essa vida, essas pessoas, essas coisas, todas elas. Ela me tirou tudo de uma vez só. Fez o meu mundo desmoronar, e aquela vida que eu tinha, acabar.
Hoje, eu não tenho mais nada. Tudo e todos estão distantes, muito distantes de mim. Tudo o que me restou foi voltar para o meu canto, aquele que, mesmo sem eu acreditar, tentou me proteger do sofrimento da perda.
E agora, volto a dizer as palavras ditas no início desse texto: se eu soubesse que a dor da perda era tão grande, eu nunca teria saído do meu canto.